O manual completo sobre o Kung Fu e sua história

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Kung Fu é o termo
utilizado, principalmente no ocidente, como sinônimo de arte marcial chinesa.
Mas, Kung Fu, pode ser traduzido como
“habilidade adquirida pelo esforço”. 
Assim, o Kung Fu pode ser entendido como um conjunto de práticas para se
alcançar a maestria, tanto luta quanto em outras artes.

Introdução

O Kung Fu é um termo que geralmente é usado para se referir
a todas as artes marciais de origem chinesa. Ele começou a ser usado na década
de 1970 em nível mundial, junto com a popularização do Kung Fu no ocidente
pelos cinemas e televisão.

Há muitas lendas e fatos misturados na história dessa arte.
Nesse artigo você vai aprender a definir corretamente o termo Kung Fu e entender
o que é apoiado por fatos históricos e o que é mito.

Em seguida você descobrirá como uma arte criada para a
guerra evoluiu para se tornar uma arte de manutenção da saúde e desenvolvimento
pessoal.

Significado de Kung
Fu

Kung Fu significa “trabalho árduo”.  Ele pode se referir tanto à habilidade
marcial quanto qualquer habilidade em uma arte.

Kung é mérito,
resultado, realização.

Fu é pessoa,
humano ou indivíduo.

Assim temos a ideia de um mérito ou resultado alcançado por
meio de esforço pessoal. Se pararmos para pensar, essa é a definição de
qualquer habilidade. Por isso, um praticante “faixa preta” tem um bom Kung Fu
da mesma maneira que um cantou ou pintor tem um bom Kung Fu nas suas áreas de
atuação.

Origem lendária do
Kung Fu

Como a arte marcial é pré-histórica, muitas das informações
que temos vêm de tradições orais e lendas. Conheça alguns desses mitos.

Os três augustos

Arte representando os três augustos

Na China há lendas que narram a criação da civilização, nelas
três personagens tem um papel de ancestrais da humanidade. Eles ensinaram as
leis, técnicas de caça e fabricação de armas.

Fu Xi é o
primeiro herói desse período (aproximadamente 2.800 a.C.). Ele seria o
responsável por ensinar à humanidade a ideia de civilização.

Chi You,
posterior a Fu Xi, é considerado o criador das armas de metal. Por isso ele
também é conhecido como o deus da guerra. Sua imagem com chifres remete ao jiao di, luta na qual os participantes
usavam capacetes com chifres e que tem uma dinâmica parecida com o judô.

E Huang Di, O Imperador Amarelo, foi o
criador da carruagem de guerra (zhi nan
Che)
. Ele combateu Chi You na batalha de Zhuolu (2.700 a.C.). Huang Di
derrotou seu adversário usando sua invenção e poderes mágicos.

Bodhidharma e o Templo Shaolin

Outra lenda
famosa é a do monge hindu Bodhidharma, que ao peregrinar pela China espalhando
o budismo, se instalou no Monte Shaoshi, em Henan.

No templo Shaolin, construído em 495 a.C. nesse monte, ele
teria meditado por nove anos em uma caverna. Ao sair de lá ele teria ensinado
aos monges exercícios que dariam origem ao Kung Fu.

Essa é a lenda mais famosa sobre a criação do Kung Fu, porém
ela ignora toda a história marcial da China.

Origem histórica do
Kung Fu

As artes marciais existem desde que o ser humano precisou
caçar para se alimentar. Ao pegar um pedaço de madeira e lapidar uma ponta nele,
nossos ancestrais criaram a primeira arma. O historiador Dohrenwend, por
exemplo, afirma que a lança foi a primeira arma a ser criada.

Para entender o Kung Fu hoje é necessário saber um pouco da
sua evolução.

A Idade da Pedra

A prática marcial era necessária para a vida, pois no
Paleolítico (1,7 milhão de anos até 10.000 a.C.), o ser humano era nômade e
coletor. Não havia técnicas e nem sistemas de luta, pois todo o conhecimento
nessa área estava sendo desenvolvido na prática.

Pintura rupestre representando a caça

No Neolítico (7.500 até 2.100 a.C.) começam a aparecer referências
em pinturas rupestres de técnicas e ferramentas não materiais. Isto é,
estratégias e táticas, como emboscadas e ataques de posições superiores. 

Armas de arremesso e ataque a distância aparecem pela
primeira vez há 700 mil anos. Na província de Shaanxi, foram encontradas
evidências de que o conceito de lançar
já fazia parte do repertório marcial da humanidade há pelo menos 30 mil anos.

No final do neolítico já existem vestígios de conflitos
entre humanos. Isso representou um salto na criação e aperfeiçoamento de
técnicas marciais. Surgiu a separação entre técnicas e equipamentos que eram
usados para a caça e para a guerra.

No mesmo contexto, surgem tratamentos para lidar com os
ferimentos desses conflitos. É bem provável que escudos e armaduras tenham
surgido nessa época. O conflito, seja na caça ou na guerra, foi fundamental
para o desenvolvimento inicial do Kung Fu e da humanidade como um todo.

A Idade do Bronze

Nesse período temos a transição das armas de pedra para o
metal. A história registrada da civilização chinesa se inicia aqui, junto com
as dinastias. Em cada época houve avanços nos métodos de treino das artes
marciais:

  • Dinastia Xia (2100-1600 a.C.) – é a primeira
    dinastia histórica e define o momento de transição entre as culturas neolíticas
    e do metal. Surgem as armas de bronze e as primeiras escolas que ensinavam o
    tiro com arco e flecha;
  • Dinastia Shang (1600-1100 a.C.) – usavam o carro
    de combate como sua principal arma de guerra. Nele havia um condutor, um
    arqueiro e um soldado armado com lanças ou alabarda;
  • Dinastia Zhou do Oeste (1100-771 a.C.) – as
    escolas Zhou ensinavam o arco e flecha como a arte marcial mais importante.
    Surge uma maior necessidade de treinar as tropas, por isso houve um maior
    desenvolvimento nos método de preparação. Surgem as danças militares (wu wu) que eram rotinas de treinamento.
    A estratégia, planejamento e matemática ganharam ainda mais importância para a
    guerra;
  • Período da Primavera e Outono (770-476 a.C.) –
    Confúcio dá atenção especial à relação entre marcialidade e intelectualidade.
    Para ser um junzi (pessoa superior)
    seria preciso levar uma vida tanto acadêmica quanto marcial;
  • Período dos reinos combatentes (476-221 a.C) –
    surge A Arte da Guerra (Bing Fa – 512 a.C.), de Sun Tzu, que
    aborda o lado menos direto da batalha, a estratégia.

Nesse período há evidencias de que a prática marcial não era
exclusiva das elites. Uma revolta de artesão e comerciantes em 841 a.C. prova
que os civis eram habilidosos no manuseio de armas.

A Idade do Ferro

A partir de 600 a.C. o ferro substitui o estanho na produção
de armas. Ele era mais abundante e mais resistente. As armas de ferro mais
antigas encontradas na China vêm das províncias de Henan e Hebei. Entre elas a
espada de dois gumes (jian),
alabardas, capacetes, facas e lanças.

Chen Daoming interpretando o imperador Qin em Herói (2002)

Na Dinastia Qin (221-207 a.C.) temos a primeira unificação
da China. O imperador Qin Shi Huang recolhe as armas da população e as artes
marciais passam a ser usadas cada vez mais como entretenimento. Tanto é que
Qin, em 209 a.C., instituiu o jiao di
(luta com chifres) como o esporte oficial das cerimônias militares.

Neste período, o Taoismo está em ascensão e surgem práticas energéticas
como o Chi Kung (Qi Gong, ou seja, a
maestria no controle do Chi) e a busca pela imortalidade por meio de pílulas
mágicas.

Já na Dinastia Han do Oeste (206 a.C.- 24 d.C.) temos uma
maior associação da habilidade marcial com a intelectualidade. Duelos nas
intrigas políticas se tornam mais evidentes em registros históricos.

A espada de dois gumes (jian)
cai em desuso no campo de batalha e passa a ser vista como um símbolo de poder
e cultura. Como a técnica dessa arma é muito complexa e bela, intelectuais a
admiravam. Por exemplo, Sima Qian (145-86 a.C.), um historiados chinês da
antiguidade, era reconhecido como um grande espadachim.

A Idade do Aço

É na dinastia Han do Oeste (206 a.C.- 24 d.C.) que o aço
começa a ser usado. Porém, mesmo com esse avanço, os chineses foram forçados a
repensar suas táticas de guerra para lidar com os ataques dos xiangnu (hunos).
Os carros de combate dos Han eram muito lentos, por isso eles estavam em desvantagem.

Os invasores usavam cavalaria ligeira e sabres de um gume,
que cortavam melhor que a espada de uma mão chinesa.  Dessa forma os chineses passaram a usar
sabres e espadas de duas mãos (aposentando a jian).

Junto com os avanços marciais a arte marcial continuava
sendo praticada para fins diferentes da guerra. Por exemplo, a luta corporal
desarmada nunca foi útil em um contexto de guerra, mas ela era muito usada como
entretenimento e também era pré-requisito para evoluir na carreira militar.

Essa admiração pelas artes marciais e o perigo nas
fronteiras, fez com que os Han produzissem vários documentos.  O manual mais antigo onde temos imagens de
pessoas com e sem armas ou imitando animais é datado desse período.  Mas não se sabe se ele é um manual marcial ou
de ginástica (dao yin).

Período dos Três Reinos
(220-280 d.C.)

Mapa da China antiga com a divisão territorial entre os três reinos

Entre 220 e 280 d.C. os reinos de Wu, Shu e Wei se
enfrentavam constantemente, pois com a queda dos Han se criou um vácuo de poder
na região. Nesse cenário conflituoso há vários relatos de artistas marciais
habilidosos.

Os nobres, letrados e plebeus treinavam para melhorar suas
técnicas de luta com e sem armas. Esse era o espírito da filosofia
confucionista que aconselha a equilibrar a vida intelectual e marcial. Mas
também era uma necessidade devido ao contexto violento da época.

Ironicamente, cada vez mais o Kung Fu é associado ao
entretenimento. Demonstrações com armas eram muito frequentes. O jiao di também era muito popular, seus
torneios atraiam vários viajantes.

Por volta do ano 400 d.C. já existem registros de
imperadores e nobres usando a arte marcial para manter a saúde. Algumas pessoas
seguiam uma vida vegetariana aliada a uma rotina diária de exercícios.

Na dinastia Sui (581-618 d.C.), as
competições de luta continuavam populares, mas os intelectuais perderam o
interesse no lado técnico das artes marciais e passaram a se concentrar na área
de estratégia e planejamento. Por esse motivo não há muitos textos sobre as
técnicas marciais nesse período.

Os Exames Imperiais

Com os imperadores Sui se iniciam
os exames imperiais. Essas provas extremamente difíceis tinham como objetivo
garantir que os funcionários do Estado fossem somente os mais capazes. Mais
tarde, a imperatriz Wu Zetian (690-705 d.C.) institui os exames militares para
reorganizar sua cúpula militar com pessoas mais capazes.

Os exames avaliavam a força,
coragem e habilidades com a lança a cavalo e tiro com arco. Eles também pediam
uma altura mínima de 1,80m. Porém não havia provas teóricas que abordassem a
estratégia, por exemplo. Por isso eles eram muito criticados.

Ao longo dos séculos os exames
foram se diversificando. Claro que sempre dependendo da visão dos líderes
políticos de cada época. Porém, no séc. XIX os exames estavam ficando
obsoletos.

Enquanto o uso de armas de fogo ficava
cada vez mais comum nas outras nações, os exames ainda cobravam o tiro com arco
como habilidade de guerra primária. Em 1901 os exames militares foram
realizados pela última vez.

Dinastia Tang (618-907 d.C.) e
as festividades marciais

Fantasia de um leão chinês do sul. Um artista marcial fica na frete segurando a cabeça e o outro atrás, formando o corpo do leão.

No período da Dinastia Tang (618-907 d.C.) surgem as
demonstrações festivas relacionadas à arte marcial. A Dança do Leão (uma dança
realizada por uma pequena banda e duplas de artistas marciais debaixo de uma
fantasia de leão) e feitos de Chi Kung, como andar em lâminas ou se equilibras
em espetos, eram comuns em festas. Demonstrações de movimentos marciais com
música eram muito apreciadas também.

Nessa dinastia e relação entre filosofia (wen) e arte marcial (wu) é muito clara. A esgrima passa a ser
ainda mais apreciada e é associada à escrita. Ambas as artes necessitam de
concentração e treino árduo.

Também surgem os “romances de cavaleiros” ou wuxia. Essas histórias geralmente
retratam bravos e nobres guerreiros que usam suas habilidades marciais para
sobreviver e salvar pessoas em perigo durante suas jornadas pela China.

Dinastia Song (960-1279 d.C.) a criação das academias
militares

Durante a Dinastia Song (960-1279 d.C.) já temos o uso de
pólvora na guerra. A Coleção das Mais
Importantes Técnicas Militares
, de 1044, aborda técnicas com armas brancas
e de fogo, como usar minas e fórmulas para fazer pólvora.  

Os Song sofreram diante dos constantes ataques dos mongóis (ou
mengu). As pessoas dessas tribos
cresciam aprendendo a caçar com o arco enquanto cavalgavam, os tornando
guerreiros impressionantes.

Em resposta surgem academias militares focadas em tiro com
arco, o uso da atiradeira chinesa (um arco que disparava pedras), balaestra,
machado, espada, escudo e bastão longo. Métodos de treinos menos mortais
começaram a ser usados, como colocar pontas de couro nas flechas de treino.

As exigências do treino militar eram um dos motivos que
tornavam a vida de soldado uma condenação à morte. Alguns civis se mutilavam
para evitar o serviço. Essa visão do exército se agravou com as várias derrotas
dos Song.

O motivo dessas derrotas pode estar associado ao fato do
primeiro imperador Song, Taizu (960-976), passou a indicar civis inexperientes
por medo de golpes militares.

Pouco tempo depois, em 1041, o imperador Renzong proibiu as
sociedades militares. Armas de uso militar foram proibidas para os civis e
rituais, demonstrações ou peças teatrais só podiam usar réplicas das armas.

Essas medidas podem ter minado o desenvolvimento militar
chinês durante o período Song. Isso foi fatal no destino dessa dinastia.

Dinastia Yuan (1271-1368 d.C.) e a proibição de lutar

Benedict Wong interpretando Kublai Khan na série Marco Polo (2014)

Em 1271, Kublai Khan conquista os Song e cria a dinastia
Yuan. Seu governo proibiu os chineses de treinarem as “artes de ataque” (gongci zhi) e lutas esportivas foram
proibidas. Armas cerimoniais em templos foram substituídas por cópias de papel
ou barro.

Tudo isso não agradou a população, principalmente porque os
mongóis ainda treinavam a cavalaria e o arco e flecha. O povo chinês, se viu
desapropriado de sua cultura.

Junto aos mongóis vieram os hui, uma etnia de religião mulçumana. Esse povo ganhou fama na
China por ser forte e ter aptidão marcial. Muitos estilos de Kung Fu tem
sua origem creditada aos hui.

Dinastia Ming (1348-1644), o desenvolvimento dos manuais
militares

Com o fim do reinado mongol, a China volta a ser governada
pela etnia han. No séc. XVI a China
se viu sob constante ataque dos mongóis e piratas japoneses. Isso se deve, pois
a prosperidade dos Ming era evidente para seus vizinhos. Porém, o exército Ming
estava mal treinado e equipado. Os militares não conseguiam defender
efetivamente as províncias.

Generais como Yu Dayou (1503-1579) e Qi Jiguang (1528-1588)
dedicaram suas vidas na defesa do território Ming e aperfeiçoamento das tropas.
Uma das formas que eles encontraram foi a de melhorar o preparo das tropas, que
era quase inexistente. Por isso surgem manuais militares e técnicos.

No final da Dinastia Ming (1348-1644), as teorias marciais
começam a ser associadas ao esoterismo e religião. Assim, a alquimia taoista
começou a ser associada ao Kung Fu. Porém a arte marcial nesse período mantinha
como objetivo principal derrotar o adversário.

O Budismo, Confuncionismo e Taoismo com certeza
influenciaram o Kung Fu de maneira geral ao longo dos séculos. Porém, os
fundamentos em que se baseiam as artes marciais é a experiência de combate.

A arte da guerra é uma atividade diversa. É preciso entender
de técnicas marciais, geografia, psicologia, estratégia, etc. Por isso não é
incomum que aspectos religiosos se misturassem com a vida militar. Nos
acampamentos capelas faziam parte do cotidiano e alguns manuais militares
tinham encantamentos taoistas para ajudar a obter vitória.

Dinastia Qing (1644-1911)

Nesse período os manchus derrotam os Ming (que eram
liderados majoritariamente pela etnia Han) e assumem o controle da China.  Os invasores proibiram que os chineses da
etnia Han treinassem artes marciais.

As sociedades secretas e histórias
fantásticas explodem nessa época. Muitas delas são criadas e ficam populares
para defender um sentimento de patriotismo e luta pela restauração dos Ming. Os
grupos secretos foram necessários, pois havia a proibição de treinos marciais.

Representação de Zhang San Feng. Ele é colocado por Huang Zongxi como o criador das artes internas

Nesse contexto aparecem obras como
e Epitáfio para Wang Zhengnan (Wang Zhengnan um zhi Ming, 1669),
escrito por Huang Zongxi. Esse texto tem um cunho político bem forte que
praticamente criou a divisão do Kung Fu entre as artes internas e externas.

Na dinastia Qing, como afirma o
historiador Kang Gewu, o lado folclórico do Kung Fu, ou seja, aquele mais baseado
na arte do que na guerra, atingiu as cúpulas militares. Também há o fato de que
a partir do final da dinastia Ming a ginástica taoista (dao yin) passa a ser treinada junto das práticas de Kung Fu
(exercícios físicos e Chi Kung/ qi gong).
Isso mostra como o Kung fu já era visto de forma mais abrangente do que uma
simples “luta”.

Em contrapartida, havia um
“Exército Verde” (força reserva da etinia Han) que era muito bom em
demonstrações, mas que sofreram duras críticas de alguns imperadores. Isso pode
ser pelo preconceito étnico (os Qing eram manchus), mas pode indicar que os
Han, diante a proibição de treino marcial, perderam o propósito do treino.

No séc. XIX a China se vê deixada
para trás pelos países ocidentais e o Japão. Os Qing, que já enfrentavam várias
insurreições, tentaram modernizar o país. Porém, o Kung Fu foi desprezado. O
governo imperial o achava antiquado e supersticioso.

Nos anos de 1904 o governo
introduz o treinamento militar nas escolas no estilo alemão e japonês. Os
esportes ocidentais passam a ser incentivados, deixando as práticas
tradicionais de lado.

Porém, algumas instituições se
formaram para tentar equilibrar a tradição e a modernidade. Em 1909, na cidade
de Shanghai, a Associação Jing Wu (“Essência das Artes Marciais”) foi fundada.
Seu propósito era promover o Kung Fu, ensinar inglês e incentivar a prática de
esportes ocidentais.

Período Republicano (1912-1949)

Com a queda dos Qing, o grupo
Kuomintang, um movimento nacionalista, assume o poder da maior parte da China.
Esse período histórico é permeado de conflitos pelo domínio do território.

Vários generais tomaram o controle
de províncias, pois comandavam grandes contingentes de tropas. Esse foi o
período dos Senhores da Guerra (1912-1928).

Tropas nacionalistas por volta de 1930 prontos para a batalha

Logo em seguida, em 1927, o
conflito entre o Kuomintang e o Partido Comunista explodiu e só terminou no
final de 1949. No meio do conflito interno, a China se viu ameaçada pelos
estrangeiros novamente quando a Segunda Guerra Sino-Japonesa (1937-1945)
começou.

Ao final da segunda Guerra Mundial
a disputa entre o Kuomintang e os Comunistas recomeça e só termina quando os
líderes nacionalistas do Kuomintang fogem para Taiwan.

Por conta desses conflitos temos
um grande desenvolvimento das artes marciais. O treino é melhorado, pois várias
instituições trabalharam para o desenvolvimento do Kung Fu (que no período é
chamado de Guoshu ou artes
nacionais).

Instituições como a Associação
Jing Wu e a Academia Central de Artes Nacionais foram fundamentais para elevar
o condicionamento físico do povo chinês. Ao mesmo tempo, o estudo acadêmico das
artes marciais começou de fato nessas associações. Historiadores proeminentes,
como Tang Hao, viajaram pela China colhendo registros sobre a prática do Kung
Fu.

Não foi a toa que o governo
republicano deu apoio a essas iniciativas. A arte marcial foi vista tanto pelo
seu lado militar, o treinamento das tropas, quanto pela sua capacidade de
suscitar um sentimento patriótico na população.

Além disso, houve uma grande
produção de manuais teóricos sobre as artes marciais. A maior parte do conteúdo
que temos sobre estudos marciais vieram dessa época. Com a chegada da fotografia
na China, encontramos nesses manuais registros fotográficos preciosos da
primeira metade do séc. XX.

República Popular da China
(1949)

Após a rendição do Japão em 1945,
a Segunda Guerra Sino-Japonesa acaba. Sem um inimigo em comum o Partido
Comunista e o Kuomintang voltaram a se enfrentar. Depois de muitas batalhas Mao
Tsé-tung, líder dos comunistas, vence os nacionalistas em 1949.

Com a fundação da República
Popular da China mais de dois milhões de chineses ligados ao Kuomintang fogem
para Taiwan. Muitos deles eram mestres e instrutores da Academia Central de
Artes Nacionais.

Surge o Wushu Contemporâneo

Desde 1917, Mao Tsé-tung tinha a
opinião de que o povo chinês tinha focado mais na área acadêmica do que no
desenvolvimento do corpo. Esse desequilíbrio seria incompatível com o ideal
confuciano de junzi, a “pessoa
elevada”.

Praticante de Wushu mostrando o foco estético da arte marcial na China do séc. XXI

A ideologia de Mao teria
influenciado a criação do Wushu Contemporâneo. Nessa idealização os exercícios
físicos foram padronizados, o combate direto foi retirado do treino e a relação
entre mestre e discípulo foi substituída pela noção ocidental de treinador e
atleta.

O Wushu se espalhou pela China e
foi recebido com bons olhos. O povo chinês estava desconfiado das práticas
tradicionais, principalmente pelo secretismo delas. Em geral, as estruturas
tradicionais guardavam seus conhecimentos a sete chaves. O que gerou ambientes
pouco convidativos.

Sanda ou Sanchou? O combate
livre

O Sanda (combate livre) e Sanshou
(mãos livres) são duas formas de se referir ao combate direto. Ao longo do séc.
XX encontramos esses termos sendo usados como equivalentes em vários manuais e
editais de torneios. Sanda não era utilizado antes de República Popular da China
(1949-atualidade). Enquanto Sanshou foi utilizado durante o Período Republicano
(1912-1949).

Na segunda metade do séc. XX temos
uma grande preocupação das forças armadas em melhorar seu treinamento. Em 1960,
em um conflito com os russos, os chineses se veem obrigados a repensar suas
táticas. Até mesmo a posição de luta dos chineses sofre alteração.

Dessa forma, podemos ver no Sanda
uma forma mais contemporânea de se ensinar lutas na China. Porém, nesse modelo
não havia espaço para elementos mais tradicionais, como o treino com armas.

O Kung Fu em Taiwan

Enquanto a China continental ia se
modernizando e abandonando práticas tradicionais, os refugiados do antigo
regime continuaram a preservar muitos estilos de Kung Fu tradicionais. A ilha
já tinha uma tradição marcial muito forte.

Vários imigrantes foram se
instalando em Taiwan ao longo dos séculos. Muitos deles eram mestres e praticantes
de artes marciais. Entre 1895-1945, a ocupação japonesa levou a prática de
judô, kendô e caratê à ilha.

Com a revolução comunista muitos
mestres foram obrigados a se refugiar na ilha. Ali eles puderam continuar suas
linhagens. Além disso, houve um movimento para que o treinamento na região se
distanciasse do Wushu que era praticado no continente.

O Kung Fu no Cinema

O cinema foi um marco para as
artes marciais. Primeiro porque a possibilidade de se registrar as técnicas
transformou a visão sobre a transmissão do conhecimento marcial. E em segundo
por conta da indústria que se criou por volta do ano de 1920.

Nessa época já havia a produção e
exibição de filmes de wuxia e wu xia pian (novelas marciais ou filmes
de cavalaria marcial) em Shanghai. Essas histórias contavam sobre dinastias
antigas, guerreiras e guerreiros fabulosos e habilidades sobrenaturais.

Apesar da popularidade, esses
filmes não conquistaram as elites políticas e culturais. Assim, sem apoio, o
centro de produção do cinema de artes marciais se mudou para Hong Kong. A
partir de 1940, por conta dos problemas no continente, a ilha passa a ser o centro
de produção artística.

Em 1960 a Shaw Brothers tira o foco
dos filmes nos duelos de espada e passa a retratar lutas desarmadas. Em 1970
surge a Golden Haverst que trás mais inovações. Nesse período temos uma maior
profissionalização e, portanto, um aumento na qualidade dos filmes.

David Carradine interpreta o monge Kwai Chang Caine na série Kung Fu

Entre 1972 e 1975 a série Kung Fu, estrelada por David Carradine
(1936-2009), faz muito sucesso. Ela foi um marco para o aumento da popularidade
do Kung Fu e espaço na mídia.

Outro grande marco foi a carreira
de Bruce Lee (1940-1973). Ele nasceu nos EUA, na chinatown de São Francisco e se mudou para Hong Kong com poucos
meses de idade. Ele ficou lá até seus 18 anos e teve a oportunidade de treinar wing chun com Yip Man (1893-1972).

Bruce nunca abandonou as artes
marciais, mas o que ele considerava sua real profissão era a atuação. Em 1964
ele teve sua primeira oportunidade de atuar. Mais tarde ele atuaria na série O Besouro Verde (1966-1967).

Poster do filme Operação Dragão de 1973

A obra prima de Bruce Lee, quando
ele já trabalhava na Golden Haverst, foi a
Operação Dragão
(1973). Porém ele faleceu antes de pode ver sua obra
fascinar o mundo.

A partir da década de 1970 o Kung
Fu é cada vez mais representado nas artes. Atores como Jackie Chan e Samo Hung
surgem para acrescentar um ar cômico ao cinema marcial. E em 1963, nasce mais
um ícone do meio; Jet Li. Esse ator expressa o melhor do cinema marcial
contemporâneo.

Kung Fu no séc. XXI

Agora que você já viu um pouco da vasta história do Kung Fu
podemos perceber como o séc. XX foi fundamental para sedimentar os caminhos que
as artes marciais tomariam. Temos hoje um cenário bem diverso.

Há várias linhagens de mestres e instrutores espalhados pelo
mundo. Com a Revolução Cultural na China comunista, algumas práticas
tradicionais foram perseguidas. Sendo assim, hoje encontramos essas práticas
preservadas em vários locais do mundo, não só na China.

Já na própria China encontramos uma população que está cada
vez mais urbanizada e conectada com o mundo ocidental.

Na medida em que o Partido Comunista foi se abrindo
comercialmente o movimento de modernização que havia começado no final do séc.
XIX cresceu exponencialmente. Esse contexto fez com que o desempenho esportivo
fosse muito mais perseguido pelos jovens do que a preservação de tradições
antigas. O Kung Fu se encontra entre elas.

Mesmo assim, o governo chinês está empenhado em desenvolver
a prática do Wushu e de mostrar ao mundo que pode equilibrar a modernidade e
tradição. O Templo Shaolin é uma amostra desses esforços. Nele temos um local
que é ponto de visita para vários artistas marciais e livres pensadores, tanto
de dentro quanto de fora da China.

Diferentes visões e utilidade do Kung Fu

Nos últimos cem anos vimos a tecnologia transformar nossa
relação com o mundo, por isso há muita discussão sobre o papel de práticas tradicionais.
As artes marciais foram duramente afetadas pelo estilo de vida contemporâneo.

O motivo mais simples é a ascensão das armas de fogo e a
automação da guerra. As armas de fogo mudaram totalmente a forma de lutar.

Antes o treino marcial era focado na transformação do corpo.
O soldado que não treina por anos não conseguiria sobreviver a muitos
confrontos. E mesmo com o treinamento, a constituição física do soldado tinha
um peso muito maior na vitória.

Porém, com as armas modernas, a ênfase na transformação do
corpo foi abandonada. Isso se deve ao fato de que um iniciante armado com um
revolver poderia facilmente derrotar um mestre de arte marcial desarmado.

Essa evolução tecnológica fez com que se questionasse a
eficácia dos treinos tradicionais e sua utilidade. Como resposta a esse fato,
vários mestres passaram a enfatizar o aspecto mais filosófico e pedagógico das
artes marciais.

Muitos líderes e generais antigos perceberam que o
treinamento tradicional pode construir caráter nas pessoas. Seja para criar
coragem frente a um inimigo, seja para criar um sentimento patriótico e de
união na população ou então para manter o corpo saudável, as artes marciais
continuam úteis.

Sendo assim, muitas escolas passaram a focar cada vez menos
no combate direto. As exigências da sociedade ocidental não permitem (e nem
incentivam) que o cidadão comum se exponha aos riscos do treino direto da luta.
Por isso, pensando na melhor maneira de ajudar seus alunos, alguns mestres
mudaram seu modo de ensinar a arte.

Também temos o grupo que vê a arte marcial como uma forma de
expressão do corpo e potencial humano. Essas escolas prezam mais pela estética
do movimento acompanhada de uma execução impecável.

Outro grupo são aqueles mestres e praticantes que entraram
no universo dos esportes ocidentais. Muitos desses estão focados em desempenho
e resultado em um contexto de competição. O treinamento nessa forma de ver o
Kung Fu é voltado para o combate e deixa de lado os aspectos mais tradicionais.

Dentro desse movimento podemos encontra também escolas que,
apesar de não focarem na luta esportiva, se preocupam em treinar seus alunos no
combate direto com e sem armas.

Assim temos três tipos de visão sobre o Kung Fu:

  • O modelo contemporâneo de exibição (Wushu);
  • O modelo tradicional (Kung Fu tradicional em
    geral);
  • O modelo esportivo (Sanchou ou Sanda).

Também é importante lembrar que essas visões sobre o Kung Fu
contemporâneo são uma das maneiras de categorizar o treino de artes marciais
chinesas na atualidade. Podemos utilizar outros critérios também. Por exemplo,
temos os pilares das artes marciais chinesas:

  • Beleza (também pode ser entendida como
    harmonia);
  • Saúde (tanto mental quanto física);
  • Marcialidade (foco na eficiência da técnica).

Todas as escolas de Kung Fu (ou mais especificamente,
modelos tradicionais, Wushu e Sanda) abordam esses três aspectos. O que os
diferencia é a maneira como eles focam o treinamento.

Em geral, nos treinos de Sanda, temos o foco no aspecto
marcial, seguido em menor medida pela saúde e deixando a beleza de lado. Já nos
treinos de Wushu, encontramos foco maior na beleza, depois saúde e deixando a
marcialidade para trás. Nos modelos tradicionais vemos o treino focar na saúde,
depois beleza e em menor medida na marcialidade.

Porém nada disso é uma regra. O fato é que o tanto que uma
escola foca em um aspecto ou outro do Kung Fu varia muito da educação e visão
do mestre ou instrutor. Na China antiga não havia consenso na forma de se
treinar ou até mesmo na utilidade do Kung Fu. No séc. XXI temos o mesmo cenário
(talvez um pouco mais complexo).

Como é o treino de Kung Fu

O Kung Fu é uma atividade física que pode ser realizada em
vários níveis de intensidade. Crianças, adolescentes, adultos e idosos podem
usufruir dos benefícios da prática. Dependendo do método é possível que pessoas
de qualquer nível de habilidade e faixa etária treinem juntas.

O método tradicional de se treinar as artes marciais
chinesas pode ser usado para criar uma dinâmica de aula onde todos treinam
juntos. Isso é possível já que, em geral, nesse modelo, o foco principal é a
saúde dos praticantes.

Os alunos mais experientes treinam técnicas avançadas separadamente
e também ajudam os iniciantes, justamente porque são exemplos de como realizar
os exercícios básicos. O Instrutor é quem guia toda a dinâmica e transmite o
conhecimento.

Aquecimento

Antes de praticar qualquer atividade física vamos encontrar uma
sequência de exercícios leves e simples. Eles têm o propósito de aquecer o
corpo, relaxando os músculos e articulações. O preparo correto antes da prática
principal diminui a chance de lesões.

Ao longo do aquecimento, o ritmo da aula vai aumentando junto
com a temperatura e frequência cardíaca. A intensidade dos exercícios também
vai subindo. Na maior parte das escolas de Kung Fu veremos que os mais
avançados terão exercícios a mais e realizarão todas as atividades com mais
intensidade. Isso garante que a aula seja sempre desafiadora.

Parte técnica

Com o corpo preparado o praticante irá aprender as técnicas
do Kung Fu. Cada escola vai definir como organizar a dinâmica. Na maioria dos
casos veremos as graduações sendo representadas por faixas. Essas simbolizam o
nível de aprendizado do aluno e são conquistadas por meio de exames.

Toda escola de arte marcial tem um conteúdo a ser passado.
Os mestres e instrutores organizam os conteúdos em uma ordem que possibilite a
evolução gradual. Assim, em geral, as primeiras faixas contêm os princípios
técnicos e preparam o corpo para a execução de manobras mais avançadas.

Dessa lógica surgiu uma categorização das técnicas da
seguinte forma:

  • Básicos;
  • Formas ou Taolu
    (rotinas em chinês e, em japonês, kata);
  • Aplicações;
  • Toi Tchas (lutas combinadas);
  • Aplicação livre das técnicas (isto é, o combate
    direto).

Os básicos são
exercícios introdutórios. Eles podem ser tanto conteúdos simples, como as
posições de pernas e braços mais utilizadas, quanto exercícios preparatórios
para desenvolver habilidades complexas, como o manejo de armas ou acrobacias.

As formas ou
Taolus são os registros da técnica de um estilo de Kung Fu. Aos olhos não
treinados elas se parecem com danças. Porém, as coreografias cumprem a função
tanto de preservar a técnica quanto de melhorar o condicionamento físico do
praticante.

As aplicações são
pequenos trechos das formas que são treinados em dupla. Cada parte da forma tem
uma maneira correta de ser aplicada no combate. A aplicação ilustra isso e
permite que parceiros treinem juntos com um risco reduzido de lesão.

Os Toi Tchas, ou
lutas combinadas, são a evolução das aplicações. Aqui a sequência de golpes é
maior e feita com muito mais força e velocidade. Sendo assim, sua execução
exige muita precisão.

A aplicação livre das
técnicas
, ou o combate direto, é o ponto mais perigoso do treino. Nesse
estágio, o treino deixa de ser cooperativo e é preciso oferecer resistência aos
ataques aleatórios do outro praticante. Como esse nível oferece maior risco de
lesão (principalmente no treino com armas) algumas escolas e professores
resolvem deixar essa parte do treino de fora do currículo principal ou restrito
a uma turma especial.

Ao longo das aulas o praticante aprende várias técnicas sem
armas. Porém, com o tempo, ele também vai estudar o uso das armas tradicionais
do Kung Fu, como o bastão e a espada.

Modalidades

Quando falamos de arte marcial chinesa temos o Kung Fu sendo
representado pelos vários estilos que o compõe. Temos o estilo Louva-a-deus,
Garra de Águia, Shaolin do Norte, Hung Gar, Taiji quan, xinqyi quan, bagua
zhang e muitos mais.

Porém, o Tai Chi Chuan é muitas vezes visto como algo
completamente diferente e afastado do Kung Fu. Dado os vários benefícios para a
saúde que o Tai Chi Chuan proporciona, ele é muitas vezes encarado como uma
terapia. No entanto ele foi desenvolvido e ensinado de maneira bem parecida com
os vários outros estilos de Kung Fu.

A diferença entre o Tai Chi Chuan e o Kung Fu

Com o tempo foram aparecendo categorias para diferenciar um
tipo de arte de outra. O Kung Fu é um termo usado no ocidente como sinônimo de
arte marcial chinesa. Se levarmos essa definição ao pé da letra teremos que
considerar o Tai Chi Chuan como um tipo de Kung Fu. Por isso, quando falamos
“Kung Fu”, no geral, esse termo se aplica ao Tai Chi Chuan também.

Uma das formas de classificar o Kung Fu e o Tai Chi é a
diferenciação entre estilos internos e externos de Kung Fu.

Artes externas:

  • Gera e aplica energia pelos músculos e ossos;
  • Usa força contra a força do adversário;
  • É mais “duro”;
  • Sua origem é o Templo Shaolin.

Artes internas:

  • Gera e aplica a energia universal qi/chi;
  • Usa e desvia a força do adversário;
  • É “sutil”;
  • Baseia-se no taoismo – estilos como o taijiquan (boxe ultimo supremo), xinqyi quan (punho da forma e da
    intenção ou punho do corpo e da mente) e bagua
    zhang
    (palma dos oito trigramas).

Porém essa divisão tem vários problemas quando estudamos sua
história. A primeira vez que vemos essa distinção é no Epitáfio para Wang Zhengnan (Wang
Zhengnan um zhi Ming
, 1669), escrito por Huang Zongxi.

Esse texto foi escrito em uma época onde o povo chinês se
viu fortemente reprimido. Os Qing, estrangeiros, destituíram a dinastia nativa
Ming. Henning e Wile, pesquisadores da história da China, argumentam que Huang
estava associando o Norte/Shaolin/ budismo com os invasores manchus enquanto o
Sul/Wudang/taoismo com os han (povo nativo da região).

Assim, essa divisão entre as artes dos templos de Shaolin
(as externas) e as de Wudang (as internas) teria uma motivação política. Isso
significa que no final o Kung Fu e Tai Chi Chuan são artes marciais chinesas
(em outras palavras: Kung Fu), mas cada uma tem uma lógica própria que merece
um estudo separado.

Estilos

Na China antiga não havia uma definição clara para o Kung
Fu. Em cada época as pessoas davam um nome diferente para a arte. É importante
lembrar que, dadas as limitações tecnológicas, as pessoas eram muito mais
isoladas. Por isso a cultura o era também. Cada região tinha seu próprio jeito
de nomear e até mesmo treinar a arte marcial.

Em toda vila, mesmo que pequena, havia um professor de artes
marciais. Ele podia ser um oficial aposentado, aventureiro ou um veterano de
guerra. As pessoas da vila acabavam por aprender a maneira de lutar do
instrutor mais próximo delas. Não havia muita escolha.

Com o passar do tempo as famílias desses instrutores
desenvolveram essas técnicas criando sistemas de luta. Esses sistemas eram
identificados pelo nome da família. Assim, o estilo Yang de Tai Chi Chuan é o
estilo que a família Yang desenvolveu.

Esse laço com a família é tão forte nas artes marciais que
até hoje alguns mestres preferem não dividir certos conhecimentos com pessoas
que estejam fora do circulo familiar (família nesse contexto não se limita a
laços de sangue, o parentesco se dá pela relação de mestre e discípulo também).

Por isso que temos mais de 300 estilos oficiais de Kung Fu
catalogados. Já que cada região desenvolvia sua técnica, era de se esperar que
uma variedade enorme de estilos fosse criada. Principalmente pela extensão do
território chinês.

Cada estilo conta a história de uma pequena comunidade e é o
registro de aspectos da arte e cultura de um povo.

Estilos do Norte e do Sul

Essa é uma classificação muito comum para se diferenciar os
vários estilos de Kung Fu. O Rio Yangtsé é a referência para essa divisão. Assim,
os estilos são identificados pela posição geográfica em relação ao rio.

Além disso, temos o ditado: “Pernas do Norte e Punhos do Sul”
(nan quan bei tui).

Norte:

  • Uso de pernas;
  • Nortenhos tem uma média de estatura maior;
  • Região fria, muita roupa, o que atrapalha o
    movimento dos braços;
  • Região rochosa, solo firme ajuda nos chutes.

Sul:

  • Uso de braços;
  • Sulistas tem uma média de estatura menor;
  • Região quente, pouca roupa favorece o uso dos
    braços;
  • Região lamacenta e irregular, solo instável
    prejudica o uso de chutes.

Essa divisão faz sentido, mas as
exceções a essa regra são muito numerosas. Isso faz com que seu uso não seja
adequado. Com certeza há estilos que se concentram mais nas pernas ou braços,
porém a posição relativa ao Yangtsé dificilmente era a razão de ser disso.

Outro ponto importante é que a
maioria dos estilos de Kung Fu foi criada mais ao norte. O sul da China era
muito mais próspero e estável, ou seja, sua população sofria menos com os conflitos.
Foi o contexto perturbador dos povos do norte que os fizeram desenvolver mais estilos
de Kung Fu.

Benefícios do Kung Fu

O Kung Fu é uma atividade física. Por isso, ele proporciona
todos os benefícios de se manter o corpo em movimento. Afinal de contas, os
seres humanos são animais racionais que precisam se exercitar para se manterem
saudáveis.

Ao mesmo tempo, o Kung Fu é também uma arte que se baseia no
comportamento adequado ante qualquer situação, principalmente sob pressão. Ele
pode nos ajudar a controlar nossas emoções para agir da melhor maneira.

Benefícios no corpo e na mente

  • Desenvolve o condicionamento físico;
  • Aumenta a flexibilidade;
  • Aumenta a força muscular;
  • Melhora o fôlego;
  • Desenvolve coordenação motora;
  • Previne doenças;
  • Evita o desenvolvimento de doenças crônicas;
  • Melhora o equilíbrio físico;
  • Estimula a liberação de neurotransmissores
    essenciais para o bem-estar.

Nosso corpo é bem parecido com uma máquina sofisticada. Como
um carro que precisa de cuidados, o corpo humano também precisa passar por
manutenções constantes. Quando ficamos parados nosso corpo atrofia e fica
fraco. Por isso o sedentarismo é a porta de entrada de várias doenças.

Os sábios antigos da China acreditavam que as doenças eram
causadas por um desequilíbrio no corpo. Assim, se ficamos doentes com
frequência, mesmo que de forma leve, estamos recebendo um aviso sobre esse
desequilíbrio. 

Treinar Kung Fu exige sempre um pouco mais do corpo. Isso
deixa nossa imunidade e vigor mais fortes. Isso também exige que cuidemos mais
da nossa alimentação e descanso. Esses fatores ajudam a manter uma rotina
equilibrada.

Benefícios no comportamento

  • Aumenta a autoestima;
  • Desenvolve virtudes;
  • Desenvolve o equilíbrio e controle emocional;
  • Desenvolve a capacidade de tomar decisões sob
    pressão;
  • Cria um senso de companheirismo;
  • Cria um senso de disciplina;
  • Constrói caráter.

Além de fortalecer nosso corpo físico, o Kung Fu permite
lapidar nosso caráter. Filósofos ocidentais, como Aristóteles, já defendiam que
a virtude podia ser desenvolvida nas pessoas por meio da educação.

Na antiguidade, a educação do corpo era vista quase sempre
ligada com a educação da mente. Assim, pensadores, como Platão e Confúcio,
formularam teorias que explicam como um povo deve educar suas crianças ao
utilizar uma pedagogia que tratasse o corpo e a mente como partes de um todo.

Por volta dos anos de 1500 d.C. encontramos manuais de
generais chineses que usaram o Kung Fu para desenvolver a coragem e espírito de
união entre suas tropas. No séc. XX, o governo Republicano usou o Kung Fu para
criar um senso patriótico nos cidadãos. Tanto é que nessa época as artes
marciais chinesas eram chamadas de Guoshu,
ou seja, “artes nacionais”.

Esses exemplos históricos são uma prova de que o treino
marcial voltado para o desenvolvimento do caráter não só é possível, como foi
usado diversas vezes com sucesso. Por isso, podemos nos beneficiar do mesmo
método no séc. XXI para manter corpo e mente em equilíbrio e cuidar das nossas
emoções expressando-as de uma maneira saudável.

Como vimos o Kung Fu é uma arte milenar e muito vasta. O
conhecimento dos mestres antigos é válido até hoje. Por isso, treinar Kung Fu não
é só uma atividade física ou uma defesa pessoal. O Kung Fu é a busca incessante
pelo autodesenvolvimento. Entre em contato
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