Como encontrar um bom mestre de Kung Fu?

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Nesse texto você vai encontrar um guia para avaliar um bom mestre de Kung Fu. Mas antes, você vai entender como o conceito de mestre pode ser definido e relacionado com as tradições chinesas.

O que é um mestre

Um mestre é aquele que domina alguma arte. Além disso, ele também pode ser aquele que passa essa arte para as gerações futuras. Ainda mais, há significados culturais que influenciam nossas expectativas de como deve ser um bom mestre.

A definição do dicionário

Para entender um conceito, o primeiro passo é olhar seu significado em um dicionário. Isso dará pistas sobre o uso do termo e suas variações possíveis. Ao olhar no dicionário Priberam podemos ver que mestre significa:

mes·tre
(latim magister, -tri, o que comanda ou dirige, chefe, professor)

substantivo masculino

1. Pessoa que ensina. = DOCENTE, PROFESSOR

2. Indivíduo que exerce um ofício por sua conta, ou que trabalha sem indicações técnicas de outrem.

3. Aquele que dirige uma oficina.

4. Artista (pintor ou escultor) de grande mérito.

5. Pessoa que domina muito bem uma profissão, uma arte, uma atividade.

6. Iniciador de uma escola literária.

7. Superior de ordem militar.

8. Tudo o que pode servir de ensinamento (sendo geralmente do gênero masculino).

9. Pessoa que detém um mestrado.

10. [Maçonaria]  Terceiro grau da ordem. maçônica.

11. [Maçonaria]  Pessoa que tem esse grau.

12. [Náutica]  Comandante de barco. = ARRAIS, PATRÃO

adjetivo

13. Que é o mais importante (ex.: ideias mestras, trave mestra). = PRINCIPAL

14. Que tem grande importância. = IMPORTANTE

de mestre
• De grande qualidade (ex.: foi um trabalho de mestre).

Feminino: mestra.

Nessa definição podemos notar que mestre é sinônimo de professor ou de uma pessoa habilidosa. Mestre também pode significar algum título, que dá certos poderes em uma hierarquia a alguém.

A definição cultural

Contudo, a definição do dicionário é muito abrangente e diz pouco da carga cultural que esse termo pode carregar. Um mestre pode ser entendido como uma pessoa que está totalmente acima de nós. Esse tipo de concepção é muito comum em meios espiritualistas e religiosos, por exemplo.

Mestre também pode ser simplesmente uma pessoa que domina uma arte. Nesse caso, o peso que uma cultura dá para essa arte faz toda a diferença na estima que se dá a esse título. Um mestre no futebol é muito mais reconhecido por sua arte do que mestre que se dedica a educar crianças.

O contexto dos mestres de Kung Fu: China

Na China a figura de mestre de Kung Fu é misturada com a noção de pai na estrutura familiar chinesa. Assim, além de um professor, o mestre tem o papel de paterno e a escola se torna um ambiente familiar.

A estrutura familiar e social

Na cultura chinesa encontramos a representação de um povo que teve que se organizar para prosperar. Essa organização permitiu que os chineses se unissem para defender sua terra, tanto contra catástrofes naturais, como enchentes, quanto contra invasores estrangeiros. Assim, o respeito à hierarquia é algo fundamental no pensamento chinês, pois ele está ligado à própria origem da formação de seu tecido social.

Há também um aspecto importante no pensamento político da China antiga que é a harmonia entre a sociedade e a estrutura família. É na filosofia confucionista que encontramos a argumentação que sustenta essa ideia. A autoridade do pai e do soberano é análoga, portanto, se as famílias de um povo estão em harmonia, o governo também refletirá isso.

A ética proposta por Confúcio vai, consequentemente, deixar clara quais são as obrigações de cada parte das relações. O governante deve cuidar do seu povo como um pai deve cuidar de seus filhos. Em contrapartida, os súditos devem obediência ao governo e os filhos aos pais. Essa mesma ética pode ser encontrada nas famílias marciais, que eram núcleos familiares que desenvolviam técnicas de combate.

A relação tradicional entre mestre e discípulo

Toda essa malha de relações sociais está emaranhada em tudo que é da tradição chinesa. E como toda tradição, ela está ligada ao contexto histórico e necessidades de um povo em determinado momento.

Na china imperial, e no mundo pré-industrial em geral, tudo era mais lento, mas difícil. Sem ter como se locomover facilmente, era muito comum que os estudantes de artes marciais morassem junto de seus mestres. Sob o mesmo teto, eles dividiam tudo, especialmente as tarefas domésticas.

Sendo assim, o imaginário que temos dos monges Shaolin, treinando e vivendo em seus monastérios, reflete bem a vida de vários artistas marciais. Alguns tinham templos, outros tinham casas ou “quintais”, mas em geral o ritmo da vida obrigava mestre e discípulo a viverem juntos.

Essa vivência, somada à forma como o pensamento chinês vê as relações sociais, representa a visão tradicional do que um mestre de Kung Fu deve esperar de seus discípulos e vice-versa.

Os mestres esperam de seus discípulos obediência total, que fizessem os serviços domésticos e até mesmo assumissem suas dívidas. Tudo isso exatamente como se os alunos fossem filhos dos professores. Já os discípulos esperam do mestre ensinamentos e cuidado. Orientação nas horas difíceis e, é claro, que eles nunca desistissem deles enquanto alunos.

A adaptação da tradição

Ao analisar com cuidado as relações entre mestre e discípulo tradicionais, podemos perceber problemas para mantê-las no séc. XXI. Nossas relações sociais são diferentes daquelas da China antiga. Na era digital o espaço físico perde a relevância e a interação da nossa vida pública e privada é mais confusa.

Em um contexto tradicional, seu mestre de Kung Fu estaria no direito de aprovar ou não um companheiro ou companheira seu. Se você já tivesse realizado o bai shi, um contrato cerimonial onde a relação do aprendiz e mestre de Kung Fu é oficializada, sua profissão e até mesmo como você investe seu dinheiro, seriam temas que seu mestre teria que opinar (e muitas vezes permitir).

Na sociedade ocidental (e até mesmo na oriental) do séc. XXI, esse tipo de comprometimento é muito delicado, facilmente se tornando um abusivo ou inviável. Tanto o é que não se vê com frequência a aplicação desse contrato de maneira tão extremas.

Muitos mestres flexibilizaram esse conceito com o passar do tempo, justamente pela falta de sentido que é sustentar certar exigências. O que vemos é um esforço em resgatar o melhor da tradição sem interferir nos valores sociais e éticos da contemporaneidade.

Então, o que faz um bom mestre de Kung Fu?

Falar de um bom mestre de Kung Fu é falar de alguém que é bom na arte e sabe passá-la para frente. Mas como já vimos, existe uma enorme carga cultural por trás desse título. No entanto, considerando o contexto atual, um bom mestre de Kung Fu deve, antes de qualquer coisa, ser um bom professor. Afinal esses termos são intercambiáveis.

Aqui estão alguns pontos que você deve observar ao buscar um professor de Kung Fu:

1- Um bom mestre ensina bem

Esse talvez seja o critério mais simples na sua busca. Se você achar que seu professor não é claro o suficiente ou que não se esforça para ser compreendido fique alerta! Um bom professor deve estar sempre disposto a se fazer entendido, afinal, ele trabalha ensinando sua arte. Especialmente se o aluno é novato ou tem alguma dificuldade de aprendizado, o mestre deve ser extremamente paciente para ensinar.

2- Um bom mestre demonstra habilidade no que faz

Esse fator é importante, mas também tem resalvas, pois habilidade somente não é o suficiente. Um bom mestre tem um bom nível de habilidade na sua arte. Ele não precisa ser o melhor, mas já deve ter praticado o suficiente para cultivar determinadas capacidades. Cada arte, modalidade ou estilo de Kung Fu ditará quais habilidades você deve esperar do seu professor.

3- Um bom mestre de Kung Fu é humilde

A humildade é uma virtude que devemos esperar de qualquer pessoa. Porém, professores e mestres devem ser exemplares nisso. Isso é verdade, pois o conhecimento é um eterno aprendizado. Quem domina uma arte sabe que nunca poderá saber de tudo. Se seu professor diz que sabe de todas as coisas e nunca admite estar errado, provavelmente ele ignora o tanto que ele ainda tem que aprender.

4- Um bom mestre se reinventa

Se um bom mestre reconhece seus erros ele também se reinventa. A pessoa que sempre faz tudo igual, que nunca muda de opinião ou que não está disposta a se flexibilizar, tende a deixar de aprender. Afinal, o que é o aprendizado se não uma abertura a novas ideias?

No Kung Fu, você deve observar como o mestre lida com a tradição. Se ele segue a tradição e a adapta ele provavelmente tem um conhecimento profundo daquele saber. Mas se o mestre simplesmente copia a tradição e não explica como adaptá-la no contexto, ele possivelmente não sabe muito bem do que ele está falando.

5- Um bom mestre de Kung Fu tem caráter

Esse é o ponto mais complicado de avaliar uma pessoa, portanto, o mesmo vale para um mestre de Kung Fu. Para avaliar o valor moral de alguém é preciso de tempo. Mas, mais que isso, é preciso passar por dificuldades juntos.

Infelizmente, só conhecemos a maioria das pessoas quando as vemos em situações críticas. Sendo assim, observe como seu mestre reage quando as coisas não dão certo ou quando ele recebe críticas. Essas reações dirão muito sobre o caráter dele, bem mais do que nos tempos de fartura.

6- Um bom mestre não abusa de seu poder

Esse ponto é o mais importante. Não somente para mestres e professores, mas para qualquer um que esteja em uma posição de autoridade.

Um professor é uma figura de autoridade muito forte. Primeiro ele é detentor de um saber. Quem aprende algo não sabe, logo ele pode ser enganado com qualquer tipo de informação. Por isso, ser um mestre é responsabilidade sobre o conhecimento de uma arte e sua propagação da forma mais correta possível.

No mundo do Kung Fu isso é ainda mais sério. Pois a cultura marcial, sustentada pela cultura chinesa, é muito mais exigente quanto à obediência. Portanto, o aluno já espera uma determinada firmeza do professor. Um mestre mal intencionado pode facilmente abusar dessa reverência e respeito do aluno.

Em suma, cuidado! Se seu mestre de Kung Fu (ou qualquer professor) violar sua privacidade ou ameaçar sua integridade física ou psicológica pare e reflita sobre o ocorrido. Fique atento também para abusos trabalhistas caso você tenha a intenção de dar aulas. No mundo das artes marciais, o trabalho voluntário pode facilmente se misturar com a servidão.

Essa é a nossa reflexão sobre como encontrar bons mestres de Kung Fu. Você já encontrou bons mestres que se preocupavam genuinamente com você? Conte-nos mais nos comentários!

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