Confúcio – Espírito Ritual, o terceiro pilar do confucionismo

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Na cultura chinesa os ritos são muito importantes. Eles acompanham momentos de festividades e celebração, mas também integram a rotina familiar e decisões governamentais. Nas artes marciais, especialmente no Kung Fu, os ritos são fundamentais para o desenvolvimento de virtudes éticas.

Nesse texto você vai entender as bases filosóficas que baseiam a visão confucionista sobre as relações humanas.

O que é um ritual

Antes de explicar os detalhes do conceito de Li, espírito ritual, de Confúcio, é preciso refletir sobre o que significa um rito. Provavelmente, a primeira coisa que lhe vem à mente é uma cerimônia religiosa. Porém, a definição antropológica é bem mais abrangente. Podemos definir rito como:

“Qualquer processo e prática de caráter sagrado ou simbólico, capaz de determinar e desenvolver costumes”.

No cerne dessa definição temos a ideia do símbolo. O ritual é a representação física de uma intenção interna. Essa intenção pode ser religiosa, ética ou até mesmo afetiva. Agora você vai entender a importância desse termo na filosofia chinesa.

Li, o espírito ritual

O ser humano é um animal social, logo ele não existe solitário. Desde que nascemos estamos em relação direta com a nossa família, as pessoas que cuidam de nós. Observando esse fato, Confúcio percebeu que o ser humano, enquanto um ser de cultura, só existe em relação ao outro.

Assim, o Ren (o senso de humanidade) é expresso pelo ritual:

“Vencer seu ego para reintegrar-se no sentido dos ritos, isso é o ren” (XII,2).

Confúcio entende que o ego, nossa faceta mais individualista, deve ser superado. Isso só é possível por meio de uma disciplina rigorosa que possa nos fazer interiorizar realmente a ideia de humanidade. Os ritos pavimentam o caminho para essa superação.

A intenção sincera do ritual

Para viver bem em sociedade devemos, portanto, superar nossos desejos egoístas e colocar a humanidade como prioridade. Nossas ações individuais e coletivas devem servir ao povo.

“Em público, comporta-te como se estivesses em presença de um convidado importante. No governo, trata o povo com toda a gravidade de quem participa de um grande sacrifício. O que não gostarias que te fizessem a ti, não o faças aos outros” (XII,2).

Seguir os rituais é tratar a si mesmo e aos outros com o respeito que eles merecem. Quando somos educados e polidos com as pessoas na nossa vida cotidiana, estamos demonstrando nosso respeito por meio de pequenas atitudes.

O ritual só tem real significado se a ação externa for coerente com nossa intenção interna. Por exemplo, quando em uma aula de Kung Fu os alunos e professores se reverenciam, estamos vendo a materialização do sentimento de respeito entre a turma.

Assim, o rito por si só é vazio. Ele só tem impacto real na medida em que as pessoas que o realizam lhe dão o devido valor. Por isso a etiqueta e polidez por si só não podem ser os únicos critérios éticos.

A base da ética de Confúcio: o rito e a justiça

Como somente o Li, o ritual, não é suficiente para a demonstração de respeito, Confúcio vai sempre associá-lo ao ren, ao senso de humanidade. A ética, ou seja, a reflexão sobre o que é justo ou injusto só pode existir no momento em que o rito é acompanhado de um sentimento interno.

Um rito executado por aquele que ainda não desenvolveu as virtudes humanas (como a generosidade e lealdade) não está em harmonia com o senso de humanidade. Para tanto, é necessário que ao executar os rituais tenhamos realmente entendido o ren, que tenhamos realmente respeito uns pelos outros.

Confúcio entende que a humanidade é algo que deve ser aprendido. Nascer homo sapiens não é suficiente. Temos que aprender por meio dos ritos a desenvolver o senso de humanidade. Por exemplo, as crianças só passam a dar sentido ao mundo humano na medida em que elas vão se integrando nos rituais.

Os ritos se tornam o caminho para nos tornarmos mais humanos dentro da visão confucionista. Eles nos ajudam a harmonizar nossas relações e estabelecem relações de reciprocidade. Portanto, os ritos são fundamentais para uma sociedade justa. Eles nos tiram do nosso egoísmo e individualismo naturais e nos levam a agir visando o melhor para o povo.

Tradição e Cultura

Dito tudo isso, é importante perceber que Confúcio não defende a repetição dos ritos e tradições dos antepassados sem nenhuma reflexão. O “senso de justiça” (Yi) é utilizado no confucionismo para descrever o conjunto de sentidos que cada um investe na sua maneira de ser e na comunidade humana.

Assim, é necessária a reinterpretação de cada um sobre a tradição coletiva culminando em um novo sentido. Com o passar de gerações a cultura vai se transformando e os ritos acompanham essa evolução. Não é a toa que Confúcio vai expandir o conceito de ritual na cultura chinesa ao associar os ritos como fundamentais na construção do caráter de um indivíduo.

A partir daí a religião fica em segundo lugar nas cerimônias e o foco passa a ser a própria ideia de respeito que o ritual quer reafirmar. É pelo fato de apreciar a tradição que o confucionismo cria uma ponte que liga os antepassados com as pessoas que vivem no presente.  Além disso, os ritos são visto como formas de harmonizar as relações humanas, garantindo que a justiça prevaleça.

Até hoje o confucionismo é utilizado como base para métodos pedagógicos. Muita da sabedoria dessa filosofia é focada em ensinar às crianças a se tornaram junzi, ou seja, pessoas elevadas que valorizam a cultura e o próximo.

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